São 10hoom, marca o relógio de parede, mas poderiam ser outras horas ou outros minutos!
Nesta manhã de nevoeiro em que todos parecem apressar-se para apressar a vida, o sussurro preso na garganta, parece ganhar vida e por entre o lábio superior e a chávena de fumegante sai: A vida não acaba mais depressa por andarem a correr atrás do tempo!
Ninguém o ouviu
mas ele saiu, muito de mansinho!
Mas nem os ouvidos do senhor que partilha comigo o balcão parece perceber a língua do meu sussurro!
Inscrevi-me numa escola em que aprendi as línguas mais faladas, visitei os países, falei a língua deles, a do meu país e entenderam-me. Quando falei a minha fala, as minhas palavras o mudo ensurdeceu!
Comecei a brincar com a colher no líquido quente da minha chávena, fiz espirais e vácuos e senti-me o próprio líquido em espiral na enormidade de pessoas que enchiam o café e as ruas do outro lado do vidro.
Recomecei a beber o líquido que saia da chávena esfumegante!
No jornal matutino o horóscopo estava mais cinzento, as notícias mais negras e as fotos mais degradantes do que era habitual! Sai abandonando o jornal e dirigi-me para o metro!
Para não romper a monotonia a carruagem ia cheia de pessoas que pela manhã colocam a máscara do lobo mau. Novo sussuro preso na garganta
e desta vez nem com a mão sobre a boca ele ficou calado.
Quanto terei ainda percorrer para encontrar alguém que fale as minhas palavras!
Ninguém pareceu perceber que o meu sussurro tinha escapado por entre os dedos da mão enluvada que queria prendê-lo! Só o mendigo, ébrio de bebidas destiladas, perfumado com cheira mal desde 1900, pareceu ouvir-me! Com olhos amarelados olhou para mim. Saiu-me novo sussurro. Ninguém pareceu ouvir, ele voltou a olhar-me com olhos esbugalhados!
Alguém ouvia a minha voz! Alguém entendia as minhas palavras!
Sai do metro na minha paragem habitual e sorri-lhe com um: - Bom dia!
A que ele me respondeu numa das línguas estrangeiras que estudei. Sai da estação para o nevoeiro, vento frio a abarcar-me o corpo, ouvidos abertos para as palavras e vozes dos outros!
Se uma pessoa me ouvia eu poderia ouvir outras pessoas a falar as suas palavras e talvez elas pudessem ouvir-me e eu ouvi-las!